Os desafios de ser uma criança negra no Brasil, começam antes mesmo do nascimento, algumas pesquisas que indicam que gestantes negras recebem menos cuidado e atenção durante o pré-natal, trabalho de parto e pós-natal, e consequentemente, se a mãe está recebendo cuidados diferenciados, a criança também está.
E ser negro no Brasil é conviver com o que chamamos de ideal da brancura. O ideal da brancura concentra o branco como referencial de humanidade, de beleza, caráter e intelectualidade. Enquanto a negritude é rotulada com diversos estereótipos de inferiorização, animalização, subordinação, de feiura e sujeira.
Dois exemplos deste ideal é o cabelo liso como referencial estético, enquanto o cabelo com curvatura e crespo é lido como duro, ruim e sujo. Ou ainda, quando o mesmo comportamento emitido por uma criança negra e uma branca, é entendido como “bagunça” da criança negra, e como “brincadeira” da criança branca. E a criança entende isso a partir de mensagens verbais e não verbais que elas recebem. As mensagens verbais são aquelas nas quais as crianças ouvem coisas que a descaracterizam, como quando ela sofre bullying na escola ao ouvir sobre o seu cabelo e o seu corpo, ou recebendo apelidos pejorativos. E as mensagens não verbais, de quando a criança não entra em contato com referências negras positivas, ou recebem menos cuidados e atenção na escola, por exemplo. As crianças também entram em contato com isso através dos enredos dos desenhos, filmes, e histórias que apresentam sempre um personagem branco, que ocupa o lugar de princesa ou de herói, que no final da história é digno de receber toda as coisas boas, atenção e amor, enquanto os personagens negros, quando aparecem, são associados à estereótipos inferiorizante.
Desde muito cedo então as crianças negras entendem que o outro grupo social possui privilégios e ocupa lugares que o seu grupo social não ocupa. E a falta de referências negras positivas, pode levar a criança negra a idealizar uma identidade branca e uma negação do próprio corpo, já que ele se distancia disso que é valorizado socialmente.
É importante afirmar que tanto as crianças negras, quanto as brancas captam essas mensagens, de modo a criar a ideia de superioridade para a criança branca, pois elas também entendem que o seu grupo racial possui privilégios..
Tudo isso influencia drasticamente na construção da identidade e da autoestima das crianças negras, que desde muito cedo internalizam as mensagens que inferioriza e desqualifica o seu grupo racial. A baixa autoestima, crises de identidade, sintomas emocionais, ansiedade, depressão, sensação de não pertencimento, crença de estar sempre errado, e a negação da negritude são resultados desse processo.
Uma forma de reverter isso é inserir no cotidiano das crianças referências negras positivas, seja através de histórias verídicas de reis, rainhas, príncipes e princesas negras, fazendo um resgate à cultura, ou através de desenhos, filmes e livros. É fundamental também que os adultos enalteçam as belezas e competências intelectuais das crianças negras, o que pode ser feito através de elogios às suas características físicas e validação das atividades realizadas por elas. E por último, mas não menos importante, conscientizar as crianças de que não somos todos iguais, e de que não há problema algum nisso, promovendo um espaço que respeita as diferenças.
Essas medidas podem ser adotadas pelos cuidadores das crianças, como pais, irmãos, tios, etc., mas é fundamental que isso aconteça também na escola, afinal a criança passa boa parte do seu dia inserida no ambiente escolar. É fundamental então que a escola esteja atualizada às práticas antirracistas e com políticas de conscientização dos profissionais, pais e alunos.
É importante que os pais de crianças negras acompanhem às políticas escolares, busquem participar ativamente da vida escolar dos filhos e estejam atentos a qualquer violência racial que a criança possa sofrer. Caso isso aconteça, é fundamental primeiro o acolhimento dos sentimentos da criança, e posteriormente uma cobrança de posicionamento da escola.
Por fim, para formarmos crianças negras com autoestima e saúde mental, precisamos ensiná-las a amar as suas características, inseri-las na cultura e história negra, e afirmar constantemente as suas qualidades e potências, isso possibilitará que elas olhem a si mesmas e aos semelhantes com carinho e amor. .
Eu me chamo Fernanda, sou psicóloga clínica na cidade de Maringá, e você pode conhecer mais do meu trabalho no meu instagram @fernandacaroline.psi
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